Dieta de baixa
gordura não impede câncer ou doenças no coração
O maior estudo já
realizado para descobrir se uma dieta de baixa
gordura impede as mulheres de desenvolverem
câncer ou doença cardíaca revelou que a dieta
não teve nenhum efeito.
O estudo federal de US$ 415 milhões envolveu
aproximadamente 49 mil mulheres com idades entre
50 e 79 anos, que foram acompanhadas por oito
anos. No final, as que realizaram dietas de
baixa gordura apresentaram a mesma incidência de
câncer de mama, câncer de cólon, ataque cardíaco
e derrame que aquelas que comiam qualquer coisa
que desejassem, informaram os pesquisadores
nesta terça-feira (7/2).
"São três estudos totalmente negativos", disse o
dr. David Freedman, um estatístico da
Universidade da Califórnia em Berkeley, que não
está ligado ao estudo, mas escreveu livros sobre
projeto e análise de testes clínicos. E, ele
disse, os resultados devem ser levados a sério
pelo que são --uma tentativa rigorosa que
fracassou em confirmar uma hipótese popular de
que uma dieta de baixa gordura pode impedir três
importantes doenças nas mulheres.
E os estudos foram tão grandes e tão caros que
são "os Rolls Royces dos estudos", disse o dr.
Michael Thun, que dirige o centro de pesquisa
epidemiológica para a Sociedade Americana do
Câncer. Assim, ele disse, provavelmente eles
serão a palavra final.
"Nós geralmente temos apenas uma chance de um
estudo em grande escala sobre uma questão em
particular", disse o dr. Thun.
Os estudos fizeram parte da Iniciativa da Saúde
da Mulher dos Institutos Nacionais de Saúde, o
mesmo programa que mostrou que a terapia
hormonal após a menopausa apresentava mais
riscos do que benefícios. Neste caso, os estudos
de dieta trataram de um problema complicado. Por
décadas, muitos cientistas diziam, e muitos
membros da população acreditavam, que o que você
come --a composição da dieta-- determina a
probabilidade de você desenvolver uma doença
crônica.
Mas tem sido difícil de provar. Os estudos de
fibras alimentares e câncer de cólon fracassaram
em provar que a fibra era protetora. Os estudos
de vitaminas que supostamente protegeriam contra
o câncer fracassaram em mostrar algum efeito.
Gradualmente, muitos pesquisadores de câncer
começaram a questionar a hipótese gordura
alimentar-câncer, mas ela manteve força na
imaginação popular.
"Nada fascina tanto a população americana do que
a noção de que o que você come em vez de quanto
você come afeta sua saúde", disse o dr. Peter
Libby, um cardiologista e professor da Escola de
Medicina de Harvard.
Mas os novos estudos, relatados na edição de 8
de fevereiro do "Journal of the American Medical
Association", revelaram que as mulheres que
foram designadas aleatoriamente a praticar uma
dieta de baixa gordura comeram uma quantidade
significativamente menor de gordura ao longo de
oito anos. Mas elas apresentaram a mesma
incidência de câncer de mama e cólon, assim como
de doença cardíaca.
E, confundindo muitas noções populares sobre
gordura na dieta, as dietas diferentes não
fizeram muita diferença no peso das pessoas. A
crença comum de que os carboidratos na dieta
levam a níveis mais elevados de insulina, níveis
maiores de glicose no sangue e mais diabete
também não foram confirmados. Não ocorreu nenhum
efeito entre as mulheres que se alimentavam com
dieta de baixa gordura.
Quanto aos fatores de risco de doença cardíaca,
o único afetado foi o colesterol LDL, que
aumenta o risco de doença cardíaca. Os níveis
eram ligeiramente maiores nas mulheres que
tinham uma dieta com maior gordura, mas não o
suficiente para fazer uma diferença notável em
seu risco de doença cardíaca.
Os estudos seguem uma pesquisa menor, divulgada
no ano passado, sobre dietas de baixa gordura
para mulheres que tiveram câncer de mama. Aquele
estudo insinuou que comer menos gordura poderia
ajudar a impedir a recorrência. Mas o atual
estudo, que perguntava se uma dieta de baixa
gordura poderia proteger as mulheres da
ocorrência de câncer de mama, apresentou
resultados que ficaram aquém da relevância
estatística, o que significa que poderiam ter
ocorrido por acaso. Resumindo, não há evidência
sólida de que uma dieta de baixa gordura ajuda
na prevenção.
"Estes estudos são revolucionários", disse o dr.
Jules Hirsch, médico-chefe emérito da
Universidade Rockefeller, que passou uma vida
estudando os efeitos das dietas sobre o peso e a
saúde. "Eles devem colocar um fim a esta era de
pensamento de que dispomos de toda a informação
que precisamos para mudar toda a dieta nacional
e tornar todos saudáveis."
Apesar de todas as participantes do estudo terem
sido mulheres, os resultados de câncer de cólon
e doença cardíaca devem se aplicar aos homens,
disse o dr. Jacques Rossouw, o diretor do
projeto para a Iniciativa da Saúde da Mulher.
Ele explicou que os estudos de observação que
levaram à hipótese de câncer de cólon-gordura
alimentar revelaram consistentemente que as
mulheres e homens respondiam da mesma forma à
gordura alimentar.
Os resultados, concordaram os investigadores do
estudo, não justificam a recomendação de dietas
de baixa gordura para a população para redução
seu risco de doença cardíaca e câncer.
Quanto à sociedade do câncer, disse o dr. Thun,
com estes resultados que ele descreveu como
"completamente nulos no estudo de oito anos
sobre ambos os cânceres e doença cardíaca", seu
grupo não tem planos para sugerir que as dietas
de baixa gordura protegem contra o câncer.
Mas o dr. Rossouw disse que ainda está intrigado
com os dados de câncer de mama, apesar de não
serem estatisticamente significativos. As
mulheres em baixa dieta de gordura apresentaram
um taxa 9% menor de câncer de mama --a
incidência foi de 42 entre 1.000 por ano nas
mulheres que realizaram dieta de baixa gordura,
em comparação a 45 entre 1.000 por ano nas
mulheres que realizaram uma dieta normal.
Isto poderia significar que a gordura na dieta
pode ter um efeito pequeno, disse o dr. Rossouw,
talvez em alguns subgrupos de mulheres, ao longo
de um período mais longo de tempo. Ele
acrescentou que os pesquisadores do estudo
continuarão acompanhando as mulheres para ver se
o efeito se torna mais pronunciado.
Outro dos investigadores do estudo, o dr. Rowan
Chlebowski, um oncologista do Centro Médico
Harbor-Universidade da Califórnia em Los
Angeles, compartilha as esperanças de Rossouw em
relação à dieta de baixa gordura. "Haverá
interpretações diferentes, mas há motivo para
otimismo", disse Chlebowski.
Apesar de os pesquisadores de câncer terem dito
ter ficado decepcionados com os resultados, os
pesquisadores de doenças cardíacas disseram não
ter ficado totalmente surpresos com a simples
redução da gordura total não ter tido efeito.
"O problema é que este estudo foi concebido duas
décadas atrás, quando a moda era baixa gordura",
disse o dr. Libby. Agora, ele disse, ele e
outros foram persuadidos de que a chamada dieta
do Mediterrâneo é a melhor --não necessariamente
redução de gordura, mas redução de gordura
saturada, como manteiga e queijo cremoso. Isto,
somado a exercício, deve ajudar a prevenir
doença cardíaca, ele disse.
Mas, é claro, tal conselho nunca foi testado em
um grande teste clínico aleatório, reconheceu o
dr. Libby. E, ele disse, "se realizarem um
estudo a respeito e der negativo, então terei
que desistir das minhas hipóteses queridas em
prol dos dados".
A dieta de baixa gordura não foi fácil, notou o
dr. Chlebowski. As mulheres foram instruídas a
realizar uma dieta que continha apenas 20% de
suas calorias na forma de gordura. A maioria
cortou substancialmente sua gordura alimentar,
mas a maioria ficou aquém da meta de 20%. A
dieta que foram instruídas a realizar "é
diferente do que a maioria das pessoas come",
disse o dr. Chlebowski. Ela significou, por
exemplo, nada de manteiga no pão, nada de queijo
cremoso em roscas, sem óleo no tempero das
saladas.
"Se um médico disser a um paciente para comer
menos gordura, isto não terá efeito nenhum", ele
disse. "Se você enviar alguém a um dietista,
isto representará quase nada." As mulheres no
estudo participaram de 18 sessões em pequenos
grupos com nutricionistas treinados no primeiro
ano e quatro sessões por ano depois disto.
No primeiro ano, as mulheres em dieta de baixa
gordura reduziram o percentual de gordura em sua
dieta para 24% das calorias diárias e no final
do estudo suas dietas continham 29% de calorias
na forma de gordura. No primeiro ano, as
mulheres no grupo de controle ingeriam 29% de
suas calorias como gordura e no final sua dieta
de gordura continha 37%. Alguns especialistas
destacaram que o estudo não significa que as
pessoas devam abandonar as dietas de baixa
gordura.
"O que estamos dizendo é que uma redução modesta
de gordura e uma substituição por frutas e
legumes não representou nada para doença
cardíaca, derrame, câncer de mama ou câncer
cólon-retal", disse o dra. Nanette Wenger, uma
cardiologista e professora de medicina da Escola
de Medicina da Universidade Emory. "Mas não quer
dizer que não seja benéfica", ela acrescentou.
Mas a lição geral, disse o Dr. Freedman, é
clara.
"Muitos dados de observação mostram que a dieta
importa, mas tais estudos apresentam grandes
falhas e este é o motivo para fazermos
experiências", ele disse. "Nós, a comunidade
científica, tendemos a agir de forma histérica e
a dar conselhos de dieta baseados em evidência
trivial."
Fonte: Gina
Kolata |